O estado do Ceará vivia, até 2008, um problema comum a muitas
administrações públicas brasileiras. Gastos com telecomunicação
sufocavam o orçamento enquanto a infraestrutura caminhava a passos
lentos e se mostrava insuficiente para acompanhar a digitalização de
serviços públicos — entre eles a educação — e atrair empresas do setor
privado.
O gargalo começou a ser resolvido no final de 2011, quando entrou em
operação, após quatro anos de obras, o Cinturão Digital do Ceará, uma
iniciativa de R$ 78 milhões que liga 49 cidades do estado a uma estrada
de 2.500 km de internet de alta velocidade via fibra ótica. O projeto
foi custeada por investimento do Tesouro do Estado do Ceará, do
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e de crédito oriundo do
Banco Mundial.
O tronco que hoje passa por 345 escolas da rede estadual tira
vantagem da posição da capital do estado, segundo conta Fernando
Carvalho, ex-presidente da ETICE (Empresa de Tecnologia da Informação do
Estado do Ceará). “A gente sempre soube que aqui fica o ponto de
entrada e de saída dos cabos para a América Latina, o que faz de
Fortaleza uma região estratégica por estar na mesma distância dos EUA,
da Europa e da África”.
O governo gastava R$ 32 milhões por ano em serviços de telecom e a gente
viu que o retorno do investimento em infraestrutura viria em apenas
dois anos.
Segundo Carvalho, que também é professor do departamento de
computação da Universidade Federal do Ceará (UFC), a outra vantagem
evidente era de ordem financeira. “O governo gastava R$ 32 milhões por
ano em serviços de telecom e a gente viu que o retorno do investimento
em infraestrutura viria em apenas dois anos”, analisa.
O embrião do cinturão começou com o projeto da Rede Nacional de
Ensino e Pesquisa (RNP) chamado GigaFOR, em 2007, que consistia em uma
rede de 54 km para conectar universidades e instituições de pesquisa na
região metropolitana de Fortaleza. Em um acordo com o governo do estado,
que se responsabilizou pela manutenção da infraestrutura em troca do
uso para instituições públicas
Para dar conta da cobertura de 82% da população urbana do estado, na
segunda fase teve início a expansão da rede para o interior. Isso só foi
viável com a instalação de antenas da tecnologia Wimax (sistema de
transmissão via rádio), que oferecem banda larga sem fio em 24 cidades. A
partir da terceira fase, prefeituras do interior puderam oferecer
planos de 1 Mbps (megabit por segundo) por R$ 29,90 (em 2006, o preço
era de R$ 600). A quarta fase, em andamento, abre a possibilidade de que
prestadoras de serviço de telefonia compartilhem o direito de uso das
fibras óticas e também arquem com parte de sua manutenção.
No estudo “Infraestrutura de comunicação para a governança e o
desenvolvimento: o cinturão digital do Ceará”, Carvalho compara a nova
infraestrutura de internet a uma rodovia com pedágio, “onde todos que
possuem um serviço a oferecer podem transitar”. Para usar a estrada, o
usuário – pessoa física ou jurídica – terá que pagar cota de manutenção,
que cobrirá os custos de manutenção e expansão da rede. Com isso, a
manutenção e a expansão estarão livre da dependência por recursos
públicos.”
Como a internet chega às escolas
Antes de receber o fôlego extra e uma banda larga de fato, as escolas
tinham à disposição entre 1 e 2 Mbps fornecidos pela operadora Oi
dentro do Plano Banda Larga nas Escolas. “Com o cinturão, hoje, além do
serviço disponibilizado pelo Projeto Banda Larga, temos 138 escolas com
cerca de 60 Mbps”, afirma Betânia Raquel Gomes, coordenadora de
Aperfeiçoamento Pedagógico da Seduc (Secretaria da Educação do Ceará). A
previsão do governo é que o sinal de Wi-Fi alcance todas as salas de
aula.
No projeto, cada escola recebe quatro pontos de acesso, que são
instalados por técnicos de Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da
Educação. As escolas que já estão preparadas aproveitam de forma mais
plena recursos digitais que antes eram inalcançáveis dada a
instabilidade e lentidão da rede. “A utilização de videoconferências e
os cursos promovidos pelo Centro de Educação a Distância são exemplos do
impacto do cinturão”, diz a representante da Seduc.
Antigamente, as escolas tinham uma conexão entre 5 Mbps e 15 Mbps, que eram muito lentas e caíam.
Para ajudar professores e estimular o uso de tecnologia em sala de
aula, o estado criou uma rede de formadores distribuída nas 23
coordenadorias regionais e na superintendência das escolas estaduais.
Com isso, alunos já têm experimentado o uso de videoaulas, cursos online
e plataformas de aprendizado.
“Antigamente, as escolas tinham uma
conexão entre 5 Mbps e 15 Mbps, que eram muito lentas e caíam.
Passávamos muito tempo sem internet pela necessidade de manutenção
frequente”, descreve Eliseu Paiva, diretor da Escola Estadual de Ensino
Fundamental e Médio Dr. César Cals, que tem 1.500 alunos divididos em 36
turmas.
“Nós temos três laboratórios de informática com 20 computadores e
mais 40 notebooks que podem ser levados para a sala de aula quando o
professor solicita”, diz Paiva, que defende que “sem internet, o
computador é só um instrumento sem muita função”.
Na escola, acontecem as aulas interdisciplinares chamadas de Núcleo
de Trabalho, Pesquisa e Práticas Sociais, em que alunos preparam
projetos ao longo do ensino médio (veja exemplos no Especial Competências Socioemocionais).
“Nossas turmas têm de 35 a 40 alunos e os alunos sentam em dupla nos
laboratórios. Os 60 Mbps ainda não são o ideal, mas comparando com o que
a gente tinha, melhorou muito”, diz.
Em Fortaleza, o link dedicado com 60 Mbps de velocidade deve chegar a
todas as escolas até dezembro. Para os próximos anos, o objetivo do
projeto do Cinturão Digital do Ceará é aproveitar a malha já existente e
ligar por fibra 100% das escolas da região metropolitana. No interior, a
infraestrutura de rádio deve ser trocada por fibra, porque além da
limitação de velocidade para 11 Mbps, existe um risco de oscilação no
sinal de conexão. “À medida que existe uma demanda das prefeituras para
contratar fibra para os órgãos públicos, o projeto fica mais barato para
nós da Seduc também”, diz Giovani Campelo, gestor de tecnologia da
informação da Seduc.